Quer ser um sensor em movimento na cidade? Aceitam-se inscrições
Por toda a cidade do Porto, 817 dispositivos monitorizam uma série de eventos que interferem no nosso dia-a-dia. Pode ser o trânsito, a poluição, o ruído ou até o stress dos motoristas de autocarros. Pode ser muito mais. Muitos destes dados chegam de sensores instalados na maior plataforma de comunicação veículo-a-veículo do mundo, na qual entra boa parte da frota da STCP, mas parte deles é já fornecida por pessoas comuns, a partir dos seus smartphones. E, na verdade, o leitor, se quiser, pode passar a fazer parte desta rede que está a transformar o Porto numa cidade inteligente.
Neste momento, o Porto é já um laboratório vivo, à escala urbana, de soluções que usam a informação produzida a partir destes dados para, garantem os envolvidos, “melhorar a vida dos cidadãos”. A iniciativa partiu do Centro de Competências para as Cidades do Futuro da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, mas a câmara, outras instituições, como a Universidade de Aveiro, e empresas, algumas delas criadas a pensar neste ecossistema das smart cities, estão a embarcar nesta aventura de desenvolver tecnologias que, testadas aqui, podem ser exportadas para outras cidades.
Num ponto de situação do primeiro ano do projecto que já consumiu 45% do orçamento de 2,3 milhões de euros, vindos do 7.º ProgramaQuadro para a Investigação e Desenvolvimento da União Europeia, realizou-se ontem, no Porto, uma conferência internacional que reuniu, ao longo do dia, 570 participantes.
Um deles, o indiano Satya Nitta, da IBM, olhando para uma plateia onde, naquele momento da manhã, no claustro do Mosteiro de São Bento da Vitória, estariam umas 300 pessoas, fez umas contas rápidas. E calculou que só ali haveria uns mil dispositivos, entre telemóveis, computadores portáteis e outros aparelhos electrónicos, a produzir dados e ligados a uma rede.
Mil dispositivos numa sala! Transponha-se isto para uma cidade como o Porto e é fácil de antever a quantidade de dados em circulação e o potencial da sua partilha num sistema como o que está a ser criado.
Não é algo que aconteça amanhã. Há já uma aplicação para telemóvel, a SenseMyCity, a partir da qual cada um de nós pode contribuir, com os dados partilhados sobre as nossas rotinas de viagem, para se perceber em que zonas da cidade se gasta mais combustível, os quilómetros percorridos e até o stress que o páraarranca provoca nos condutores.
A jovem empresa que criou esta app vai trabalhar num projecto com a PSP, a partir do qual vai monitorizar, durante algum tempo, o dia-adia dos agentes, para perceber, por exemplo, o impacto da actividade destes no seu ritmo cardíaco, explicou ao PÚBLICO a investigadora Ana Aguiar, do Instituto de Comunicações da FEUP. O comandante da Polícia Municipal do Porto, António Leitão da Silva, ouviu a sua apresentação, e já pensa em fazer um projecto semelhante com os seus agentes, procurando, desta forma, perceber como o trabalho os afecta. “Temos de falar”, disseram um ao outro, à saída.
Na verdade, se muitos destes dados servem para ler a cidade — o ruído, a poluição, o tráfego —, a possibilidade de os usar para monitorizar as pessoas está a ganhar terreno.
É a área de interesse de João Paulo Cunha, do INESC TEC, que está envolvido no projecto. Para além de ter instalado sensores com várias finalidades em 400 autocarros, a STCP aceitou que este investigador convidasse motoristas para um projecto que acompanha a sua actividade ao longo do dia. São cerca de 25 os profissionais que aceitaram vestir a t-shirt da Biodevices que faz electrocardiogramas. E, das mais de 130 horas de dados já recolhidos, deu para ver, por exemplo, como quase todos os motoristas se põem nervosos à passagem pela curva pronunciada no acesso à Ponte do Freixo, no sentido Porto-Gaia.
Os dados servem para isto. Para perceber as pessoas, e para ajudar à tomada de decisões, o que poderia, neste caso, passar por uma obra naquele local. O coordenador do projecto Future Cities, João Barros, vincou, no balanço do dia, que este procura encontrar a intersecção entre as necessidades dos investigadores, dos habitantes da cidade, das empresas que nela actuam e do poder político que a governa. E o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, garantiu que a autarquia está interessada em agarrar as oportunidades abertas por este ecossistema de inovação, na área das smart cities.
E, na sua equipa, o comandante da Polícia Municipal, por exemplo, vê com bons olhos o aproveitamento de outras tecnologias aqui apresentadas para a monitorização do ruído provocado pela movida da cidade ou do número de pessoas presentes em espaços públicos e de outros aspectos da segurança urbana.
Público, 29 de janeiro de 2014