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"Os sistemas de energia estão perante uma revolução"

João Peças Lopes afirma que os desafios na energia são “enormíssimos” e que o que se pretende com o prémio é alargar as disciplinas abordadas. Numa entrevista feita à margem da conferência onde foram apresentadas as novas regras nas candidaturas do prémio REN, Peças Lopes defendeu que as universidades devem trabalhar de forma mais próxima às empresas e com objectivos concrectos.

Como professor e tendo contacto todos os dias com alunos, que expectativa tem em relação aos trabalhos que se vão candidatar ao Prémio Ren?

Espero muitos, muitos trabalhos. Os sistemas de energia estão hoje perante uma revolução enormíssima porque as renováveis estão a penetrar fortemente no sistema, a mobilidade eléctrica também, o armazenamento vai passar a ser uma realidade. Por isso os desafios são enormíssimos quer ao nível do desenvolvimento de soluções que envolvam engenharia mas também um nível de multidisciplinariedade grande, quer ao nível da implementação de soluções específicas de gestão. Questões que envolvem as próprias ciências básicas e fundamentais. Desde que aplicados à área da energia, há imenso espaço para trabalhos.

Estes temas são habitualmente abordados nos cursos existentes ligados à área da energia?

Nem em todos. Há cursos que estão mais ligados a questões tecnológicas; há cursos com uma componente mais económica e regulatória. Por isso não é necessário que todos eles toquem em todos estes pontos. Mas há um ponto em comum: todos devem abordar o tema da energia.

As candidaturas este ano são de áreas muito diferentes. O júri mudou este ano também por isso?

O júri mudou e tem pessoas com competências nas diferentes áreas. Todos eles têm contacto directo com a área da energia, uns em aspectos mais económicos, outros em aspectos regulatórios, outros mais tecnológico.

A nível da investigação na área da energia, como é que esta área está actualmente em Portugal?

Em Portugal nunca deixámos de investir em I&D na área da energia, ao contrário dos EUA, por exemplo, onde chegou a ser considerada uma área de somenos importância. Nós nunca o fizemos. E é por isso que conseguimos ter uma capacidade instalada no sistema científico e tecnológico português que não está atrás de ninguém. Temos instituições com investigadores, com equipamento, com funcionalidades e meios equivalentes aos que existem nas melhores escolas da Europa. Temos aliás dos melhores grupos de investigação do mundo na área da energia.

Os centros de investigação universitários conseguem fazer a ligação à indústria?

Sim. Na minha intervenção tive a preocupação de falar sobre isso. Por exemplo, no instituto onde trabalho, trabalhamos sempre com base em relacionamentos contratuais com a indústria. Trabalhamos com várias empresas, com Deus e com o Diabo.

Há muita pressão da parte das empresas para se conseguir resultados?

Já houve mais. As empresas vêm ter connosco na maioria das vezes quando têm problemas.

Fazem uma espécie de consultoria?

Não é consultoria. São trabalhos que envolvem modelos computacionais, modelos matemáticos avançados. Não é consultoria. Não é papel e lápis, não é powerpoint, não é excell. Envolvem meios de cálculo e de ciências fundamentais que só a universidade tem capacidade de responder.

Por que razão acha que as universidades devem trabalhar numa base contratual?

A indústria deve definir um projecto e nesse projecto estarem definidos os objectivos, o que é que se espera do projecto, calendarizar e trabalhar de uma forma profissional. Porque trabalhar na base do “agora tenho aqui uma coisa gira para dar à universidade”, não pode ser. Não funciona.

O giro não basta.

O giro não basta. O que tem de se fazer é definir, caracterizar exactamente o que tem de se fazer, o que se espera e as coisas aparecem feitas de uma forma profissional. E é isso que as universidades portuguesas devem fazer, até porque elas dependem disso para viver. Este tipo de funcionamento tem vantagens para ambos os lados. A indústria ganha, ganha a universidade e, ao mesmo tempo, tem um efeito de replicação. Porque ao fazer isto as pessoas que trabalham na universidade vão sendo formatadas para responder àquelas que são as necessidades da indústria e quando formam os seus alunos também estão a formálos para responder a essas necessidades.

Esse modelo de funcionamento é inspirado em algum modelo internacional?

É um modelo mais avançado e que não existe em todas as escolas em Portugal. Eu defendo um modelo do tipo interface. Mas um instituto de interface precisa de ter flexibilidade. E no quadro em que vivemos, de restrições orçamentais, de espartilho, de dificuldade na contratação de pessoas, não é possível trabalhar com a flexibilidade necessária para fazer este tipo de projectos. Se tiver de contratar alguém por seis meses ou um ano para fazer um trabalho, não o posso fazer porque estamos numa instituição pública devido à Lei dos Compromissos. Portanto, há que dotar as instituições de flexibilidade.

Júri com altas expectativas

A opinião é unânime para todos os membros do júri dos prémios REN. As alterações feitas aos prémios só vão aumentar a qualidade dos trabalhos e permitir alargar o âmbito a outras áreas fundamentais para o sector energético. Aníbal Santos, admionistrador não executivo da REN, defende que a ênfase dos trabalhos deve caracterizar-se “sobretudo, pela sua aplicabilidade no sector da energia” e destaca a importância da extensão aos mercados de energia e, por isso, à análise económica.

Pedro Furtado, director na REN Gasodutos, acredita que a abertura a novas áreas de conhecimento “permite uma grande diversidade temática de trabalhos” e afirma que estes prémios são “uma forma de estímulo entre o Grupo REN e a universidade, em benefício da inovação para o sector e valorização para quem produz os trabalhos”. O professor defende ser “preciso apostar nas novas gerações com rigor e qualidade, incentivando e identificando quem se esforça a fazer mais e melhor”. Frisa ainda que Portugal “tem das melhores instituições de ensino superior nas áreas que agora são abrangidas pelos prémios”, e destaca “a qualidade dos jovens”, pelo que acredita que as candidaturas serão “de qualidade e com temas desafiantes”.

O director de exploração da REN, Albertino Meneses, está convicto que o alargamento do âmbito dos trabalhos apresentados “irá trazer para a ribalta temas e linhas de investigação com interesse que, anteriormente, não teriam a visibilidade e reconhecimento justificados”. Por isso mesmo, acredita que as candidaturas apresentadas serão de grande qualidade. Já Manuel Matos, investigador do INESC TEC, informa que a reformulação do prémio “pretende abranger um espectro mais alargado de áreas, mantendo o foco na inovação dos sistemas de energia”, admitindo que espera que a mudança “atraia candidaturas de qualidade em domínios anteriormente não contemplados, mas relevantes para os ssitemas eléctricos”. A mesma opinião tem António Gomes Martins, professor catedrárico na Universidade de Coimbra, que espera “trabalhos com elevado interesse” e que as alterações tornam o prémio “ainda mais aliciante, e mais capacitado para o reconhecimento de trabalhos que, centrados nas questões energéticas, tenham em conta aspectos não exclusivamente tecnológicos”.

Miguel Moreira da Silva destaca o facto do alargamento ter sido acompanhado “pela constituição de um novo júri que inclui especialistas dessas novas áreas”, classificando a alteração do prémio como “extremamente pertinente, atendendo às mudanças na REN e na Energia”, que, frisa, “tem sistemas cada vez mais inteligentes, automatizados e descentralizados”. Daí que “um vasto conjunto de áreas do conhecimento tem sido chamado a fazer parte do desenvolvimento das redes de energia do futuro, atendendo à multidisciplinaridade dos novos conceitos e tecnologias”.

Na opinião Paulo Sena Esteves, na próxima edição “iremos assistir à manutenção de um elevado padrão qualitativo, agora generalizado a mais saberes, o que já é um ganho”.

Já Paulo Ferrão sublinha que agora o prémio “serve ainda melhor a responsabilidade mais alargada da REN no sistema energético nacional e que pode contribuir para a capacitar para uma progressiva internacionalização baseada no conhecimento”.

O perfil e a opinião do júri sobre a edição de 2013

João Peças Lopes

JOÃO PEÇAS LOPES
É Professor Catedrático da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, onde dirige o Programa Doutoral em Sistemas Sustentáveis de Energia, função que acumula com a direcção do INESC Porto, onde já coordenou grande número de projetos de I&D Europeus. Esteve à frente de inúmeros projetos de consultoria em vários países. Licenciou-se e Doutorou-se em Engenharia Electrotécnica e de computadores pela FEUP. Recebeu em 2012 o CIGRE Special Technical Committe Award pelo reconhecimento do seu trabalho excepcional na definição de estratégias optimizadas de exploração de redes de distribuição com recursos distribuídos. Publicou mais de 250 artigos em revistas e congressos internacionais.

Manuel Matos

MANUEL ANTÓNIO MATOS
Investigador do INESC TEC e da Faculdade de Engenharia da Energia. É licenciado e doutorado em Engenharia Eletrotécnica na FEUP, onde é docente desde 1977 e Professor Catedrático Agosto de 2000. É membro do Senado da Universidade do Porto e preside ao Conselho Científico do INESC Porto. Foi investigador Responsável ou participante de diversos projectos financiados pela FCT e pela União Europeia e um dos pioneiros na aplicação de conjuntos difusos na análise e planeamento de Sistemas de Energia. Acredita que a reformulação do prémio «é uma opção enriquecedora, que acompanha a evolução nos sistemas de energia e a diversificação de contribuições de diversas áreas a que se tem assistido”.

Diário Económico, 3 de junho de 2013

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