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"Não há produção de ciência de qualidade que não seja num quadro internacional"

O INESC Porto tem-se afirmado internacionalmente, contanto já com uma representação em terras de Vera Cruz, através do INESC P&D Brasil.


Entrevista a José Mendonça | Presidente do INESC Porto

Está na presidência do INESC Porto desde 2005. Quais os maiores desafios com que se tem deparado ao longo destes anos, face às funções que desempenhou anteriormente?

Ao competir internacionalmente fazendo ciência, o nosso compromisso é ter sempre presente a relevância social e o potencial impacto económico dos resultados dos projectos de investigação. É crucial dar sentido de utilidade, de aplicação, ao que fazemos, para devolver à sociedade aquilo que ela investe na ciência.

O posicionamento de charneira, como instrumento da Universidade e do Politécnico do Porto na sua "terceira missão", traz-nos um mundo de desafios e oportunidades, mas exige trabalho, criatividade e até sentido de risco, porque é necessário criar novos trilhos onde eles não existem.

"Não há produção de ciência de qualidade que não seja num quadro internacional"

Não tenho dúvida que esta é a responsabilidade mais pesada e difícil que assumi em toda a minha carreira, mas também aquela que mais excitação e recompensa pessoal me trouxe, pelo facto de ser evidente o impacto do que fazemos e a nossa capacidade em contribuir para transformar o tecido social e económico do país.

Quando tomou posse, apontou como um dos objectivos "o reforço da vertente de internacionalização do INESC Porto". Onde localiza as principais oportunidades de internacionalização, quer para o Instituto, quer para as empresas dos sectores em que actua?

Não há produção de ciência de qualidade que não seja num quadro de competição internacional. Mas, a jusante das actividades de I&D, sempre desenvolvemos projectos de investigação aplicada e de transferência de tecnologia, em parceria com empresas e outras instituições que pretendiam absorver conhecimento avançado para inovar nos seus produtos, processos, serviços ou modelos de negócio.

Desenvolvemos já projectos de I&D por contrato com muitas das melhores empresas nacionais, em áreas como a energia, telecomunicações, indústria transformadora, sistemas de informação, saúde, automação, transportes, para além de autarquias, co  missões de coordenação, hospitais e muitas outras instituições.

Os resultados obtidos e a experiência adquirida em projectos com instituições de I&D e empresas europeias abriram entretanto caminho para a prestação de serviços de I&D e consultoria avançada de âmbito internacional, em diversos países europeus e ainda no Brasil, Estados Unidos e outros.

No Brasil, desenvolveram-se parcerias contratuais e institucionais com as melhores universidades e com empresas importantes nas áreas da energia, robótica submarina e indústria. Isto criou condições para avançar para a constituição, em parceria com universidades de referência, do INESC P&D Brasil (de Pesquisa e Desenvolvimento), alavancando o nosso processo de internacionalização. 

O INESC Porto instituiu-se como um modelo de referência na forma de relação universidade-indústria. Quais os principais factores que contribuíram para esse posicionamento?

Desde logo, a missão e o posicionamento já referidos e o facto de a instituição acolher actividades que integram a cadeia de valor completa.

Além disso, as equipas de projecto incluem investigadores e engenheiros contratados, sendo a gestão entregue a seniores com muita experiência na área científica e no sector de aplicação. Um projecto de investigação por contrato, sem deixar de ser uma actividade sofisticada e de risco, implica entrega de soluções concretas, respondendo a especificações funcionais, prazos e custos bem parametrizados. Finalmente, no nosso modelo organizacional e de governação, os recursos são organizados em Unidades com dimensão e massa crítica, que agregam competências em áreas científicas complementares. Isto facilita a constituição de equipas de projecto multidisciplinares, requisito fundamental para abordar os problemas complexos do mundo real.

Em 2005, o INESC Porto tinha também no horizonte "a aposta em novas áreas do saber e na sua aplicação tecnológica". Pode concretizar algumas das apostas entretanto realizadas?

O objectivo era apostar em novas áreas do saber que pudessem vir a ser importantes na resolução de grandes desafios das sociedades no futuro.

Exemplos de apostas com sucesso encontram-se em diferentes áreas - micro-redes de energia, robôs para inspecção ambiental ou vigilância, dispositivos médicos de auxílio ao diagnóstico ou sistemas de optimização da produção industrial -, em resultado de competências avançadas em ciências da computação, novos materiais sensores, algoritmos de decisão, etc. 

Entre as áreas de competência do INESC Porto, quais se revelam mais prometedoras e estratégicas para Portugal, no sentido de o país se poder afirmar como um player de referência?

A da energia, em especial das energias renováveis, redes eléctricas inteligentes e mobilidade eléctrica. Com os nossos recursos naturais, competências tecnológicas e capacidade industrial instalada na área seria um enorme disparate desperdiçar uma oportunidade única. Estou a falar em vantagens económicas, sociais e ambientais, no curto- -médio prazo. Não é "wishful thinking"; é no superior interesse do país.

A da indústria transformadora com capacidade de competição internacional, desde moldes a componentes para automóvel, vestuário e calçado de design, máquinas e até software e produtos tecnológicos em nichos. Tudo bens transaccionáveis que conseguem aumentar as exportações, contribuindo para o equilíbrio da nossa balança. A cadeia de valor tem-se alargado e, à capacidade de fabricar bem e de forma competitiva, juntaram-se o design e a engenharia.

Finalmente, o mar, como área de enorme potencial. Apesar da dimensão da nossa zona económica exclusiva e do potencial científico em muitas áreas, desde a biologia marinha à piscicultura, ou à robótica submarina, etc, está quase tudo por fazer em termos de rentabilização económica.

"O INESC Porto lançou, nos últimos dez anos, dez empresas spin-off de base tecnológica que são, inevitavelmente, "born globals", isto é, orientadas, desde o instante em que nascem, para competir em mercados internacionais."

Como vê o futuro da indústria nacional, no contexto de dificuldade económica que o país atravessa. A indústria tradicional tem condições para implementar as transformações necessárias para crescer?

As empresas que produzem bens e serviços transaccionáveis para o mercado internacional podem ter um papel de relevo nos seus sectores e nichos de mercado, alavancando sobre as suas capacidades e competências. Para isso, terão de inovar, seguindo de perto - ou mesmo antecipando-se - às tendências dos mercados.

Para muitas, "o futuro já começou". Já construíram novos modelos de negócio, incorporaram tecnologia, alargaram as cadeias de valor por forma a incluírem o design (a montante) e a distribuição (a jusante), e consolidaram as redes internacionais de clientes e fornecedores. Aquelas que não o fizeram, podem não ir a tempo de o fazer. Terão de dar o lugar a outras mais jovens, pujantes e criativas.

O empreendedorismo é apontado como uma das soluções para os crescentes níveis de desemprego e o INESC Porto tem também objectivos relacionados com o empreendedorismo de base tecnológica. Pode sintetizar o contributo da instituição a esse nível?

Nos casos em que emergem das actividades de investigação resultados relevantes e com potencial de utilização, mas não há no mercado empresas interessadas em fazer a adopção dessa tecnologia e a sua valorização económica, a alternativa é desenvolver um novo negócio em torno de uma visão de transformação da tecnologia em novas ofertas de valor para o mercado. O INESC Porto lançou, nos últimos dez anos, dez empresas spin-off de base tecnológica em áreas como a energia, sistemas de monitorização estrutural, dispositivos médicos, multimédia, etc, que são, inevitavelmente, "born globais", isto é, orientadas, desde o instante em que nascem, para competir nos mercados internacionais.

O que ambiciona conquistar para o INESC Porto ainda no âmbito da sua presidência?

A consolidação, após duplicar de dimensão em cinco anos. Consolidação do novo modelo de governação do Laboratório Associado que coordenamos, o INESC TEC, com mais de 600 investigadores, e que se alarga à Universidade do Minho e à UTAD, e consolidação do processo de internacionalização, crucial para assegurar a sustentabilidade futura da instituição.

E ainda a ambição da cabal demonstração, através do exemplo, de que o papel das instituições é crucial para potenciar o valor das pessoas. Os reais avanços da ciência, e sobretudo a valorização do conhecimento e a sua transferência, exigem estratégia, sustentabilidade, investimento, massas críticas, multidisciplinaridade, gestão e domínio da cadeia de valor. E isso só é possível com instituições sólidas, ágeis e inquietas, que, emanando da universidade, a ajudem a realizar o enorme potencial de que dispõem em favor da sociedade.    

SOBRE O CONCURSO

José Mendonça atesta deste modo a importância de iniciativas como o Concurso Nacional de Inovação BES

"É difícil encontrar muitos exemplos genuínos de inovação com relevante impacto social e económico no nosso país. Continua, pois, a ser muito importante fazer um marketing alargado da inovação como condição obrigatória para uma empresa ser competitiva pela diferenciação. O Concurso Nacional de Inovação BES faz isso muito bem, nomeadamente através da parceria que tem com a TSF. Por outro lado, o capital semente é escasso em Portugal. E o concurso responde a isso, além da distinção e do reconhecimento público, a componente financeira do prémio transforma-se num precioso capital semente, oferecido praticamente sem burocracia.

Há mais prémios do mesmo tipo e são todos bem-vindos, mas estas duas razões tornam esta iniciativa única em Portugal."

Diário Económico, 26 de setembro de 2012

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