José Carlos Caldeira assume cargo de prestígio nacional que orgulha a família INESC TEC
Começou por trabalhar no INESC TEC a fazer processamento de texto com uma disquete. Há 27 anos, José Carlos Caldeira não poderia imaginar que o seu crescimento pessoal se deveria em parte (ele próprio o afirma) ao seu desenvolvimento enquanto profissional na instituição. Entre 1987 e 2014 viu o INESC TEC transformar-se naquilo que hoje designa como “‘um grupo de amigos’ numa instituição sólida, reconhecida nacional e internacionalmente”, tal é a familiaridade que sentia sempre que percorria os corredores do Laboratório Associado, cuja Direção abraçou em 2001. Afasta-se agora da sua ‘família adotiva’ com “tristeza” e “alguma loucura”, ou não vá passar a estar no outro lado da ‘barricada’, já que a Agência Nacional de Inovação (ANI), a que vai presidir, é responsável pelo alinhamento das políticas prosseguidas nas áreas da Ciência e da Economia. Parte para o novo desafio com a missão de reforçar a ligação ciência-indústria para alavancar a economia nacional, mas antes de se retirar deixa-nos um testemunho de um percurso marcante de quase três décadas ao serviço do INESC TEC.
1. Ligado ao INESC no Porto desde 1987, primeiro como colaborador, depois como coordenador de unidade e posteriormente (desde 2001) na Direção do INESC TEC, que balanço faz de 27 anos na instituição?
Posso dizer que cresci no INESC e com o INESC, profissional e pessoalmente. Fui “adotado” com 23 anos, quando frequentava o 3º ano do Curso de Eletrotecnia, e procurava uma oportunidade para “mexer” em eletrónica. Comecei como voluntário, a fazer wire wrapping e processamento de texto (nos primeiros Macintosh, com uma disquete) e fui evoluindo, passando por quase todos os patamares, até chegar à Direção. O facto de ter nascido e crescido numa empresa metalomecânica (da família) influenciou a minha escolha pela área industrial e foi aí que desenvolvi a maior parte da minha atividade. No entanto, o contributo da instituição para o meu desenvolvimento pessoal foi, seguramente, tão ou mais importante do que o profissional. Tive a sorte e o privilégio de conviver com colegas fantásticos, que me marcaram para sempre, e que são responsáveis por uma parte importante do que sou hoje, como pessoa. Desde os vários Presidentes e Diretores, cada um com o seu estilo, até aos meus colegas investigadores, passando pelo pessoal dos serviços, são várias as pessoas a quem devo muito e que não esquecerei nunca. Por razões óbvias, não vou referir nomes dos que ainda estão na instituição, mas permitam-me que indique duas pessoas e, através delas, agradeça a todas as outras: o Prof. Borges Gouveia (o meu primeiro “chefe”) e a Regina Freitas.
Neste período, vi o INESC a transformar-se do que posso designar como “um grupo de amigos” numa instituição sólida, reconhecida nacional e internacionalmente, que presta ao País um serviço público de alto valor e relevância, e que proporciona aos seus colaboradores condições de trabalho e oportunidades de desenvolvimento ímpares.
2. Com que estado de espírito é que tomou a decisão de sair da Direção do INESC TEC?
Com um misto de sentido de missão, tristeza, desafio, risco, dever cumprido e, naturalmente, alguma loucura. Um colega meu disse-me que ia cumprir o serviço militar obrigatório (uma vez que fui dispensado). Acho que é uma boa descrição.
3. Nestes 27 anos assistiu à transformação e crescimento do INESC TEC. Como é que caracteriza esse crescimento?
O crescimento do INESC TEC corresponde ao desenvolvimento do País. Sendo uma organização que se dedica sobretudo a promover a inovação baseada em conhecimento, ou seja, a investigação (sobretudo aplicada) e a sua valorização e transferência para o tecido empresarial, a capacidade de crescimento está intimamente ligada à evolução que se verificou, quer do lado empresarial, quer do lado académico (e da investigação). Hoje, as empresas são mais competitivas e, portanto, mais abertas à inovação e à colaboração com o Sistema Científico e Tecnológico (STN). Por outro lado, também as entidades do SCT nacional se tornaram mais abertas, e mais disponíveis e interessadas para colaborar com as empresas, nomeadamente como forma de obter receitas complementares para o financiamento das suas atividades.
O INESC TEC antecipou esta evolução e deu um contributo relevante para que ela acontecesse, e, por isso, estava bem posicionado para tirar partido dela.
4. Quais foram os maiores desafios e os maiores momentos de glória que passou no INESC TEC?
Eu diria que foram: 1. A sua criação; 2. A decisão de deixar de ser uma instituição “apenas” de investigação e passar a ser uma instituição de interface (que aconteceu com a criação dos centros de transferência de tecnologia e das atividades de incubação); 3. A reestruturação e a implementação do novo modelo organizacional (no âmbito da qual foi criado o INESC Porto); 4. O alargamento do INESC Porto, com a inclusão de unidades associadas e a criação do INESC TEC.
Os momentos de glória (ou de alegria) foram, felizmente, muitos e é difícil escolher. No entanto, há alguns momentos que recordo de forma especial: 1. Quando o primeiro desenvolvimento que fiz como investigador do INESC foi instalado numa empresa e começou a funcionar; 2. Quando recebi o primeiro extrato com as contas do núcleo do INESC no Porto, mostrando que, afinal, a nossa operação era equilibrada; 3. Naturalmente, o momento do convite para integrar a Direção.
5. Qual é a sua avaliação do momento atual da instituição?
Como já referi anteriormente, o INESC TEC é hoje uma instituição sólida, credível, respeitada e reconhecida, a nível nacional e internacional. Tem uma dimensão e uma abrangência que lhe permite abarcar desafios e projetos complexos e multidisciplinares, o que lhe confere uma vantagem competitiva significativa no mercado. Essa característica coloca-lhe também, naturalmente, alguns desafios, nomeadamente ao nível do modelo de governação e da gestão, mas, se conheço esta casa, esses desafios irão ser transformados em oportunidades para novas áreas de investigação e de trabalho, que a vão fortalecer ainda mais.
6. Para onde é que o INESC TEC caminha?
A minha previsão (e o meu desejo) é que se transforme numa instituição de âmbito internacional, desenvolvendo atividades num número crescente de países (nomeadamente os de língua oficial portuguesa, mas não só), e funcionado, a nível nacional, como uma plataforma integradora de conhecimento e competências, nas suas áreas de atuação, agregando pessoas, instituições e empresas, e projetando-as nesses mercados.
7. Além da Direção do INESC TEC, deixa também a Direção do PRODUTECH - Pólo das Tecnologias de Produção. Foi difícil abandonar este projeto?
Não vejo isso dessa forma. De alguma maneira, correspondeu a “lançar” um filho para a sua vida adulta (não a abandoná-lo). Mas sim, também foi difícil. Comparada com o INESC, é uma “relação” mais recente mas muito intensa.
8. A ANI é responsável pelo alinhamento das políticas prosseguidas nas áreas da Ciência e da Economia. Como é que encara este novo desafio?
É uma oportunidade para colocar em prática algumas das ideias e das recomendações que temos vindo a conceber e a desenvolver, agora do lado público. Por outro lado, é também uma enorme responsabilidade, porque estarei certamente “sob a mira” dos meus colegas deste lado.
9. Enquanto Presidente do Conselho de Administração da ANI vai estar incumbido de uma missão que o INESC TEC também já tem em parte na sua génese, ou seja, servir de interface entre o mundo académico e o mundo empresarial da indústria e dos serviços. Reforçar esta ligação ciência-indústria é a estratégia para alavancar a economia nacional?
É uma das principais. Isso está claramente referido nos documentos do Governo, nomeadamente na Estratégia para o Fomento Industrial para o Crescimento e o Emprego (EFICE) e na Estratégia Nacional para a Especialização Inteligente (ENEI).
Já agora, é também uma prioridade europeia, como pode ser constatado nos documentos preliminares do designado Plano Juncker, que prevê um investimento de 300 B€, sendo que um dos eixos é, precisamente, a Investigação e a Inovação, a exemplo do que já tinha acontecido com o Plano Europeu de Recuperação Económica, lançado pelo Presidente Barroso em 2008.
10. Num momento determinante para o desenvolvimento económico de Portugal e, em particular, para o Sistema Nacional de Inovação, quais são as prioridades para atingir a desejada intensidade tecnológica da economia?
A ANI tem 3 eixos principais de atuação, que contribuem para esse objetivo:
1. Promover o investimento em I&DT e a valorização dos respetivos resultados, transformando-os em inovação, competitividade e emprego, através de uma maior cooperação entre as empresas e o STCN.
2. Dinamizar uma maior e melhor participação das entidades nacionais nos programas e iniciativas europeus, visando não só a obtenção de financiamentos complementares para o esforço nacional de investimento em I&DT, mas também como forma de apoiar a internacionalização das nossas entidades e de aceder a conhecimento científico e tecnológico que possa ser valorizado por empresas portuguesas.
3. Caracterizar o Sistema Nacional de Inovação e desenvolver iniciativas que contribuam para o seu desenvolvimento e aprofundamento, visando coloca-lo ao serviço do desenvolvimento económico e social do País e torná-lo eficaz, eficiente e uma referência a nível internacional.
Ou seja, ambição não nos falta. O futuro dirá até onde conseguiremos, coletivamente, levar este desafio.
11. Finalizaremos esta entrevista, pedindo-lhe que deixe uma mensagem aos colaboradores do INESC TEC.
Sobretudo para os mais novos na instituição, a minha sugestão é que:
- Aproveitem as muitas oportunidades que a instituição vos proporciona para o vosso desenvolvimento profissional. Para além disso, o nome INESC TEC no CV conta!
- Gozem a “atmosfera” e as relações de amizade e de camaradagem que aí germinam.
- Sejam proativos e críticos construtivos: a organização precisa disso, e reconhece e recompensa.
Saí há pouco tempo, mas as saudades já são muitas ….
INESC TEC, outubro de 2014