INESC TEC leva Internet às águas do Atlântico
Pescadores “mais perto” de casa
É ainda um piloto de comunicações no Edifício Transparente, junto ao Parque da Cidade do Porto, e para já vai testar as comunicações entre este edifício e os barcos de pesca de sardinha (da cooperativa PROPEIXE) do porto de Matosinhos. A inovação por detrás deste trabalho está a cargo do INESC TEC e pretende, já no próximo ano, disponibilizar acesso gratuito à Internet wireless de banda larga a todos os utilizadores localizados ao longo da costa marítima entre as cidades do Porto e Póvoa de Varzim, até uma distância de cinco milhas marítimas, ou seja, cerca de nove quilómetros.
A tecnologia inovadora, designada Mare-Fi, baseia-se no sistema JANUS – desenvolvido pela Unidade de Telecomunicações e Multimédia (UTM) do INESC TEC e apresentado na edição de 2012 do Fórum do Mar – e está adaptada ao mar, transformando os barcos de pesca em pontos de retransmissão de sinal de Internet para outras embarcações que não estejam em alcance rádio da rede terrestre. “Pela primeira vez, pescadores, turistas ou qualquer pessoa localizada até cinco milhas da costa vão ter acesso gratuito à Internet wireless e de banda larga”, explica Rui Campos, investigador da UTM e coordenador do projeto. O objetivo “é estender a cobertura da rede da Porto Digital, que neste momento existe na cidade do Porto, até cinco milhas náuticas para dentro do mar", e “testar assim num ambiente marítimo a tecnologia que já dominamos num ambiente terrestre”, acrescenta.
Uma análise do tráfego náutico revelou que havia ainda muito a explorar neste tipo de comunicações. “Percebemos que estaria ali uma oportunidade de cobrir novos utilizadores que podem ter necessidades de acesso à Internet”, revela Rui Campos. De momento, os principais destinatários do Mare-Fi são os pescadores de alto mar, e o acesso gratuito à Internet em pleno Atlântico permitirá melhorar as suas condições. Para o investigador, o projeto tem um grande impacto social, especialmente porque permite que “os pescadores estejam mais ligados àqueles que deixam em terra, não só colegas de trabalho, mas também as suas famílias”, ou seja, “é uma forma de não se sentirem tão isolados”, adianta. Mas outro aspeto importante tem a ver com “a inclusão digital. No fundo, este projeto vai permitir alargar o acesso ao mundo digital a mais pessoas num ambiente muito particular. E isto é, com certeza, uma vantagem”, destaca o investigador.
Um sistema pioneiro no mundo
Atualmente, o cenário de comunicações com terra resume-se a três possibilidades: o acesso à Internet é feito via satélite ou através da rede dos operadores móveis – cuja cobertura no mar em banda larga acaba a poucos quilómetros da costa –, o que acarreta custos muito elevados, ou então através de rádios VHF para comunicação de voz. “O que queremos agora é levar a banda larga a este cenário e ter no mar um ambiente de Internet tal como aquele que temos em terra”, adianta Rui Campos. Mais ainda, “tanto quanto sabemos”, revela o investigador, “este é um projeto pioneiro, e não existe tecnologia Wi-Fi disponível no mar em parte nenhuma. Apesar de focado no norte de Portugal, o projeto é viável em qualquer parte do mundo”. E acrescenta: “No seguimento da participação do Fórum do Mar têm aparecido outras oportunidades de colaboração e tem havido um grande interesse na tecnologia porque ela vai ao encontro de uma necessidade real neste ambiente”.
Para os pescadores, as vantagens não serão só pessoais, mas também profissionais: “estes vão poder comercializar o peixe mesmo antes de chegarem a terra e, numa situação de emergência, o contacto com terra é facilitado, mesmo através de videoconferência", esclarece Rui Campos. Mas desenganem-se aqueles que pensam que só os pescadores poderão beneficiar desta tecnologia única no mundo. “Turistas, barcos de recreio, navios na proximidade da costa” poderão aceder à Internet da APD através do sistema desenvolvido pelo INESC TEC. De acordo com o investigador, o Mare-Fi pode inclusive ser útil “para captar turistas para a costa portuguesa”, podendo os portos usar a infraestrutura de comunicações para “publicidade aos serviços que temos em terra”, explica.
O projeto poderá ser, portanto, uma forma de promover o turismo nacional, até porque os portos funcionam como grandes portas de entrada para turistas no país, contribuindo em última instância para melhorar a economia nacional. O Mare-Fi é ainda “uma oportunidade para contribuir para uma aproximação entre os investigadores e a sociedade civil”, afiança o investigador da UTM. Este trabalho beneficia de uma série de teses de mestrado e outras investigações realizadas no INESC TEC, relacionadas sobretudo com comunicações terra–mar. Para além de Rui Campos, a equipa da UTM conta ainda com Mário Lopes e Luciano Santos, ambos alunos de mestrado, Manuel Ricardo (coordenador da UTM), Jorge Mamede, Filipe Teixeira e Jaime Dias. De destacar que o Mare-Fi não é um projeto financiado, mas sim um projeto INESC TEC, o que “confirma que com pouco e com bons recursos internos podemos fazer muito”, adianta o investigador.
Fórum do Mar – uma plataforma de lançamento de tecnologias
O protocolo de oficialização da colaboração para o Mare-Fi foi assinado entre o INESC TEC e a Associação Porto Digital no âmbito do Fórum do Mar 2013, que decorreu na Exponor e contou com a presença do Secretário de Estado do Mar, Manuel Pinto de Abreu. Será esta colaboração com a ADP, uma associação constituída pela Câmara e Universidade do Porto por forma a promover a sociedade de informação, que permitirá ao Mare-Fi utilizar a rede wireless da APD. De acordo com o vice-presidente da Câmara do Porto e presidente da ADP, Vladimiro Feliz, este protocolo promove "o crescimento desta rede, chegando agora ao mar, sendo este mais um passo na criação dos alicerces que gradualmente fazem do Porto um território inteligente”.
A edição de 2013 do Fórum do Mar – um evento que incide sobre oportunidades comerciais e novas áreas de negócio, investigação científica e atividades ligadas à Economia do Mar – centrou-se nos desafios de 2020, sendo que o INESC TEC se destacou com uma mostra de tecnologias com aplicação ao mar nas áreas da Robótica Aquática (com representação de investigadores da Unidade de Robótica e Sistemas Inteligentes – ROBIS), Sensores de Fibra Ótica (Unidade de Optoeletrónica e Sistemas Eletrónicos – UOSE), Comunidade Portuária Eletrónica (Unidade de Sistemas de Informação e de Computação Gráfica – USIG), Comunicações Marítimas (Unidade de Telecomunicações e Multimédia – UTM) e Análise de Dados Ambientais (Laboratório de Inteligência Artificial e Apoio à Decisão – LIAAD).
Promovido pela AEP – Associação Empresarial de Portugal e pela Associação Oceano XXI – Cluster do Conhecimento e da Economia do Mar, este evento de importância estratégica contou com a participação de profissionais dos diferentes setores que integram a Economia do Mar, a comunidade científica e a sociedade em geral, e teve como objetivo sensibilizar o público quanto aos benefícios que podem ser obtidos a partir da exploração sustentável do recurso que é o mar. À semelhança do ano anterior, o INESC TEC apresentou um stand em conjunto com o CIIMAR (Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental). Com mais esta presença, o INESC TEC volta assim a reafirmar o seu contributo para levar ciência que se faz em território nacional ao panorama internacional.
Em discurso direto
Carlos Pinho, Assessor da Coordenação da UTM
“O Mare-Fi é um projeto pioneiro à escala mundial e trará um conjunto de benefícios sociais e um impacto económico relevante na comunidade marítima.
Durante o Fórum do Mar a UTM estabeleceu contactos importantes com empresas nacionais e internacionais a operar no ambiente marítimo, que desencadearam já ações concretas no contexto de futuras parcerias em projetos nacionais e internacionais. Estes contactos vêm contribuir para a implementação da estratégia de I&D da UTM na área do Mar, onde se enquadram ainda colaborações com outras unidades.
Como conclusão final fica a referência que é a marca INESC TEC no Fórum do Mar, sustentada pela qualidade da investigação que leva a cabo numa multiplicidade de áreas científicas de aplicação.”
Filipe Magalhães, investigador da Unidade de Optoeletrónica e Sistemas Eletrónicos (UOSE)
“Acho que a participação do INESC TEC no Fórum do Mar 2013 foi uma aposta ganha. Além da temática do Fórum, acho que o INESC TEC também foi capaz de expor a sua elevada capacidade de inovação nos diversos setores económicos e nas diferentes áreas da sua atividade.
Em jeito de comentário global, só é de lamentar que a dimensão do evento não tenha sido maior, ainda mais quando tanto se fala das oportunidades que Portugal pode agarrar na temática do Mar.”