ICARUS: Robôs que salvam vidas
São robôs, estão a ser desenvolvidos por investigadores do INESC TEC e o objetivo é contribuírem para uma maior rapidez, segurança e abrangência nas operações de busca e salvamento em cenários de grandes desastres marítimos, como um naufrágio em que há um grande número de pessoas a cair à água. Durante o dia ou à noite, mesmo em condições atmosféricas adversas, estas ferramentas robóticas vão permitir socorrer rapidamente as vítimas, sempre em plena coordenação com as equipas de operação, permitindo resgates com menos riscos associados para os seres humanos.
A investigação decorre no âmbito do projeto europeu ICARUS, que agrega um consórcio de 24 parceiros, representativos de 10 países, e que inclui também o desenvolvimento de ferramentas robóticas para socorro em catástrofes terrestres, como terramotos, uma vertente a cargo de outros parceiros do projeto. A equipa de investigadores do INESC TEC, coordenados pela unidade de Robótica, lidera os trabalhos em ambiente marítimo, contando com a Marinha Portuguesa, o centro de investigação marinha da NATO (CMRE) e a empresa CALZONI, ambos sediados em Itália, como principais parceiros. Alfredo Martins (INESC TEC/ISEP), Aníbal Matos (INESC TEC/UP) e José Almeida (INESC TEC/ISEP) são os investigadores do INESC TEC envolvidos no projeto que teve início em fevereiro de 2012.
Antes de mais, numa primeira fase procedeu-se à especificação de requisitos e caracterização dos cenários, nomeadamente as condições de mar e de vento, o tipo de velocidades e autonomia energética, a interação humana com os robôs, entre outros. Nesta fase, pela experiência e operacionalidade, Alfredo Martins sublinha a «importância do contributo da Marinha Portuguesa».
Já numa segunda etapa, desenvolveram-se novas tecnologias e adaptaram-se diferentes ferramentas robóticas já existentes criadas pelo INESC TEC e com operacionalidade em mar. A componente elaborada de raiz nesta fase foi uma balsa salva-vidas robotizada. O objetivo passou por desenvolver tecnologia que permitisse lançar as balsas perto da área de ocorrência do desastre, insuflando-se apenas na zona do acidente. Aníbal Matos explica o que esta tecnologia traz de inovador: «O que existe são as balsas salva-vidas que estão nos navios, são atiradas à água, insuflam-se e as pessoas sobem a bordo. O objetivo é que essas balsas tenham capacidade de movimentação, possam ser lançadas de pontos mais distantes, até mesmo de terra, e que facilmente se desloquem mesmo em condições de mar mais adversas em que, por vezes, os meios tradicionais de salvamento não conseguem reagir. Quem está na água pode não ter condições de se dirigir à balsa e muitas vezes a visibilidade é reduzida. Pretende-se fazer a balsa chegar às pessoas, sem colocar as equipas de salvamento em risco».
Mas como vão chegar as balsas ao local do acidente? A tecnologia que está ser desenvolvida para esse efeito consiste num barco robô não tripulado, que terá de se deslocar, desviando-se dos obstáculos, sejam eles outros barcos, destroços ou até as próprias pessoas. De acordo com José Almeida, este procedimento permitirá uma «distribuição eficaz e rápida das balsas salva-vidas». Nesta operação de transporte, em fase de teste de transporte e lançamento das balsas, foi introduzida uma tecnologia já existente: o robô autónomo Roaz que, no âmbito do ICARUS, está a desenvolver funcionalidades novas e específicas como a recolha de dados para deteção de náufragos e obstáculos. O Roaz está assim a adquirir mais capacidades, dando à equipa «a capacidade de fazer testes em pequena escala com alguma consistência sem necessitar de ter sempre todos os parceiros», refere Aníbal Matos.
Existe já uma cápsula protótipo da balsa salva-vidas e nesta fase foram inclusive feitos testes preliminares ao largo de Sesimbra, com o apoio da Marinha Portuguesa, e em Itália, com os parceiros aí sediados. A CALZONI tem a tecnologia naval como é o caso de um dos barcos autónomos que será usado para lançar as balsas. Os exercícios com a NATO proporcionam, de acordo com Aníbal Matos, «experiências preliminares que demonstraram algumas das potencialidades [das ferramentas]».
O projeto está atualmente num processo de integração: a terceira fase, que consiste em conciliar as diferentes componentes do sistema. Aníbal Matos explica que «por si só a balsa não faz nada, nem um avião com a câmara térmica. A informação tem de chegar ao ponto do controlo para se decidir a melhor estratégia a seguir, por exemplo, se será enviado um barco tripulado ou não». Serão desenvolvidas ferramentas de treino que permitam ter operadores certificados para operar as ferramentas robóticas em segurança. «Tem de existir uma integração perfeita entre meios humanos», reforça José Almeida. Para controlar o robô, o operador poderá guiá-lo manualmente ou apenas dar a ordem. «O importante é que haja um rigor nos procedimentos de interface entre o robô e o resto da equipa humana», conclui Alfredo Martins. Há também na fase atual uma preocupação de interligação com o segmento aéreo, para cobertura mais abrangente e mapeamento de náufragos, com “drones” para dar apoio às balsas para uma aproximação precisa às vítimas.
Desenvolvida e sustentada a tecnologia, o projeto entrará num quarto nível, as demonstrações finais, que no caso marítimo decorrerá em Portugal, em 2015, num cenário de desastre simulado em larga escala no mar.
O ICARUS é um projeto com um investimento de 17 milhões de euros, cofinanciado em 12,5 milhões de euros pela União Europeia, e surgiu de uma necessidade específica de desenvolvimento e otimização dos procedimentos de busca e salvamento, através da transferência de alta tecnologia. O desafio foi lançado num concurso da União Europeia, na sequência dos últimos grandes desastres mundiais, como o tsunami na Tailândia e o naufrágio do Costa Concordia. Esta aplicação particular de ferramentas robóticas, de acordo com Alfredo Martins, «proporciona aos investigadores que trabalham em robótica a oportunidade de ver o trabalho a ser transferido para situações reais, com a relevância de se tratar de uma aplicação benéfica para a sociedade».
O ICARUS vem ainda confirmar a força da robótica “made in Portugal” no contexto internacional. Alfredo Martins destaca que «temos uma percentagem de investigadores na área da robótica muito acima da média, com um número considerável de representantes na euRobotics, associação europeia de robótica». Este consórcio do ICARUS, e de que o INESC TEC faz parte, ficou em primeiro lugar aquando da candidatura à “call” da União Europeia. «Venceu consórcios claramente muito fortes com empresas europeias de grande dimensão», destaca Alfredo Martins.
Aníbal Matos ressalva que o objetivo do projeto não é colocar o produto no mercado, mas sim mostrar que é viável. «Essa será uma fase posterior e necessita de um estudo de mercado». Mas as tendências do mercado seguem o caminho da robótica. Alfredo Martins alerta para o facto de que «o mercado global de robótica, claramente, vai crescer», dando o exemplo da área automóvel em que muitas das funcionalidades do veículo são resultado da robótica.
ICARUS EM NÚMEROS
17,5 M. DE EUROS | 24 PARCEIROS | 10 PAÍSES | 4 ANOS (2012-2015)
O INESC TEC
O ICARUS é um projeto europeu de que o INESC TEC faz parte através de duas das suas unidades: CROB e CSIG. Os investigadores mencionados neste artigo têm vínculo às seguintes entidades parceiras do INESC TEC: Instituto Superior de Engenharia do Porto (ISEP), Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) e INESC Porto.
O INESC Tecnologia e Ciência (INESC TEC) é um Laboratório Associado coordenado pelo INESC Porto.
ISEP.BI (Boletim Informativo do Instituto Superior de Engenharia), primeiro semestre de 2014